A RELIGIÃO FÁCIL | PR. RICARDO CASTRO
A RELIGIÃO FÁCIL
Às vezes fico a pensar no quanto os avanços tecnológicos e científicos têm facilitado nossas vidas. As coisas que temos hoje foram apenas sonhadas pelas gerações passadas.
Quando era adolescente, ainda tínhamos TV com seletor de canais. Era um botão grande, que ficava geralmente no lado superior direito do aparelho, o qual tínhamos que girar para sintonizar o canal desejado.
Lembro-me que assistíamos a todos os comerciais porque o trabalho que dava mudar de canal, não valia a pena. Hoje, até pelo celular é possível trocar de canais.
Antes tínhamos no máximo quatro ou cinco canais de TV. Hoje temos mais de cento e cinquenta canais de todos os tipos. E as plataformas de Streaming possibilitam que assistamos o que queremos na hora mais conveniente.
Hoje temos a internet. E que invenção maravilhosa. Por causa dela podemos ter acesso a um mundo infindável de conhecimento, sem falar que nos possibilita nos comunicar com pessoas do mundo todo em tempo real.
Antigamente, para ficarmos informados, dependíamos do jornal impresso ou sentávamos às 19:00 na frente da TV para assistir o Jornal Nacional. E acreditávamos cegamente em tudo o que era exibido.
E o celular? O que falar do celular? É um aparelho fantástico. Ao mesmo tempo ele é um telefone, um computador portátil, uma agenda, um localizador, um vídeo-game, um editor de textos, uma câmera fotográfica e muitos outros aparelhos. Antes, tudo isso eram aparelhos diferentes. E para obtê-los, tínhamos que investir uma soma astronômica.
Tudo isso é fantástico e facilitou muito nossa vida. E não estou nem falando a respeito dos avanços no campo científico, medicinal, farmacêutico e agropecuário. De fato, devemos louvar a Deus por dar essa sabedoria para os homens criarem tais coisas.
Porém, esses avanços são uma faca de dois gumes. Se por um lado facilitou nossa vida, por outro trouxe alguns malefícios.
A facilidade que temos de nos comunicar com pessoas em países distantes, nos fez preferir mais o mundo virtual do que o físico, por exemplo. Eu mesmo estou chegando à marca de quase cinco mil “amigos” em uma rede social. Mas desses, não conheço nem um terço pessoalmente.
A facilidade que temos para realizar transações financeiras, fez com que o número de golpes de estelionatários aumentasse.
E o pior de tudo, a facilidade dos avanços tecnológicos fez que ficássemos acomodados.
E, de certa forma, tudo isso tem eco na vida espiritual, pois alguns cristãos também se acomodaram espiritualmente. E quando uma pessoa se acomoda espiritualmente, ela começa a customizar o Evangelho. Ou seja, ela tira aquilo que não lhe convém e acrescenta o que julga ser bom, assim como fazemos com nossos aparelhos celulares em que baixamos ou excluímos aplicativos conforme os nossos gostos. E é dessa acomodação que surge a chamada “Religião Fácil”.
Nesta religião, Deus tem que se acomodar aos gostos dos crentes, a igreja deve se ajustar e oferecer aquilo que seus membros gostam, e os crentes passam a querer apenas aquilo que está alinhado com suas preferências.
E infelizmente isso não é algo novo. Vemos o rei Davi envolvido com algo assim. E por isso podemos fazer um paralelo com o que acontece hoje.
Em 2ª Samuel 6.1-7 vemos que Davi acabara de tornar-se rei de Israel. Isso foi o cumprimento de uma profecia proferida décadas antes. Então, para consolidar seu reinado, ele decide pegar a Arca da Aliança, que estava na casa de Abinadabe, e levar para a capital do reino, Jerusalém. A Arca da Aliança era a representação da presença de Deus no meio de seu povo.
Da casa de Abinadabe até Jerusalém, eles teriam que andar longos 16km. E além da distância, a viagem seria demorada, pois segundo a lei, a Arca deveria ser levada apenas pelos Levitas Coatitas, pois apenas eles podiam tocá-la.
Para agilizar as coisas, Davi decide dar uma ordem diferente da Lei. Seus súditos deveriam transportar a Arca em cima de um carro de boi.
Ora, mas que mal há nisso? Alguns podem pensar. Afinal, Davi tornar-se rei era o cumprimento de uma profecia. E também transportar a Arca em carro de boi era apenas um meio de agilizar as coisas. Afinal, agora o povo teria um rei segundo o coração de Deus.
Mas, nem sempre o que pensamos está alinhado com o pensamento de Deus.
Quando o cortejo foi se deslocando, houve uma grande festa. Mas tudo acabou em luto quando Deus fulminou Uzá por tocar na Arca. Acontece que os bois passaram num declive e a Arca pendeu para um dos lados. E Uzá, filho de Abinadabe, que vinha escoltando a Arca, tocou-a para não deixá-la cair.
Aqui farei um paralelo entre a busca de Davi pela facilidade e a religião fácil de hoje em dia.
Mas antes, devo explicar o uso que farei da palavra “Religião”. A palavra Religião, descende do latim Religare que quer dizer “aquilo que nos religa a Deus”. Assim, religião é tudo o que nos leva de Volta a Deus, religando-nos com Ele.
Também devo explicar que quando uso a palavra esforço, não estou me referindo à Salvação, pois esta é unicamente pelos méritos de Cristo. Mas quando falo em esforço, estou falando a respeito das bênçãos provenientes da Salvação e que são próprias do Reino de Deus.
Uma das primeiras coisas que devemos notar no caso de Davi é que, como um paliativo para a quebra da lei, ele colocou a Arca em cima de um carro novo. Talvez ele tenha pensado que pelo fato do carro ser novo (e deveria ser muito belo também), Deus deixaria passar a sua transgressão. Ledo engano. Mesmo o carro sendo de alta qualidade, Deus não estava satisfeito.
Da mesma forma acontece hoje. Muitas igrejas acham que agradam a Deus por terem uma grande estrutura e estarem com seus bancos cheios todos os domingos. Mas, se a Palavra de Deus não está sendo observada como deve ser, o Senhor não estará satisfeito.
Muitos crentes modernos não querem se esforçar em nada. Em se tratando de Reino de Deus, o que muitos querem é que tudo lhes seja conveniente. Porém, essas mesmas pessoas que não querem se esforçar, dão o seu melhor nos seus empregos para não perdê-los.
É possível que alguém leia um livro de mais de 1000 páginas, se isso lhes fizer passar em um concurso público ou ser promovido. Mas dificilmente esta mesma pessoa lerá diariamente pelo menos três capítulos da Bíblia, que podem ser lidos em cerca de 15 minutos.
Na religião Fácil, em nome da tolerância, os homens são confrontados com o seu pecado. O argumento dessas pessoas é que Jesus só falou a respeito de amor e que andava com prostitutas, pecadores, adúlteras, etc.
Com certeza Jesus andou com essas pessoas e falou muito a respeito do amor. Realmente Deus ama o pecador, mas não quer que ele permaneça do jeito que está. Todos os pecadores que andaram com Jesus mudaram de vida.
Mas para os cristãos de hoje, qualquer palavra a respeito de arrependimento é rechaçada com o escudo do “Não julgueis”.
É frustrante ver que as pessoas só tem compromisso consigo mesmas e por causa disso, essa palavra perdeu o seu sentido verdadeiro.
O pior de tudo é que existem grandes igrejas hoje que incentivam esse procedimento, quando oferecem ao povo aquilo que lhes é conveniente. Dessa forma não há mais a pregação do evangelho verdadeiro, mas apenas palestras empresariais e/ou de autoajuda. A igreja, que antes era o Baluarte da Verdade, agora vive de braços dados com o mundo. Dessa forma a igreja não é mais o Corpo de Cristo e a Noiva do Cordeiro. É apenas um local de entretenimento. É uma empresa onde um CEO enche seus bolsos com os dividendos provenientes das programações que inventa ao gosto do “freguês”.
Entretanto, o evangelho pregado dessa forma não cura. Ele apenas mascara a situação, assim como um analgésico pode mascarar uma doença pior.
Assim foi com Davi. Percorrer os 16 km levando a Arca nas costas dos levitas daria trabalho e envolveria muito esforço. Mas, percorrer esse trajeto na comodidade da carroceria de um carro de boi, envolveria um esforço mínimo. Entretanto, essa facilidade gerou a morte de Uzá.
A religião fácil gera a morte. E podemos ver sua ação na quantidade de crentes mortos espirituais da atualidade.
Até aqui falei da religião fácil, simbolizada pela ação de Davi para com a Arca de Deus. Agora falarei da religião verdadeira, que agrada ao Senhor.
Todos sabemos que as leis cerimoniais do Velho Testamento foram uma sombra do que Jesus veio fazer no tempo da Graça. Dessa forma, todas as leis cerimoniais do Velho Testamento não devem ser mais cumpridas pelos cristãos. Com isso não estou dizendo que o Velho Testamento caducou, como alguns alegam. Todas as Leis morais que constam nele estão valendo e são vitais para aqueles que querem agradar a Deus. Mas todos os rituais, com seus sacrifícios e oferendas, não precisam mais serem observados por nós.
Mas é aí onde reside um grande problema. Alguns interpretam isso como se hoje houvesse uma liberdade tal que beira a libertinagem.
Não é raro alguém justificar suas práticas anticristãs com a expressão “posso fazer isso porque estamos na graça”. Mas isso é uma falsa interpretação da Graça.
A Graça, na verdade, exige mais do que a Lei. Por exemplo, na Lei está escrito que o homem não deve matar. Mas a Graça nos diz que o homem não pode nem se encolerizar contra o seu próximo (Mateus 5.21,22). A Graça estipula que ao invés de matar aqueles que nos odeiam, devemos lhes dar um prato de comida, se eles estiverem com fome. Quem exige mais, a Lei ou a Graça?
O assassinato, que era do que a Lei tratava, é fruto da cólera, que é o que a Graça trata. Dessa forma, vemos que a Graça age na raiz do problema e não no seu fruto. Porém, sendo a cólera a raiz do problema, é muito mais difícil de ser tratada. Ou seja, o assassinato é muito mais fácil de controlar do que a cólera. Assim, entendo que na Religião verdadeira está envolvido o esforço, em contraste com a religião fácil em que seus adeptos seguem a lei do esforço mínimo.
Foi Jesus quem disse: "Desde os dias de João Batista até agora, o reino dos céus é tomado por esforço, e os que se esforçam se apoderam dele” (Mateus 11.12).
Falando a respeito de esforço e renúncia, a religião verdadeira também não dança conforme a música deste mundo. Com isso estou dizendo que quem realmente serve a Deus não pode andar conforme os moldes deste sistema pecaminoso, dominado por satanás. E como essa verdade é urgente para nossa geração! Estamos vivendo em tempos em que os cristãos vivem de braços dados com o mundo, conformados com seus moldes e aprovando suas ações, em nome de uma tolerância contrária ao cristianismo verdadeiro. Mas foi o apóstolo Paulo quem disse que os cristãos verdadeiros não podem se amoldar ao sistema mundano (Romanos 12.2) e que não podemos ser cúmplices dos pecados deles. Antes, devemos condená-los (Efésios 5.11).
Mas, o interessante desses dias é que muitas igrejas estão repletas de programações que tem o objetivo de entreter seus frequentadores. Isso porque o interesse de muitos líderes não são vidas convertidas, mas sim, bolsos cheios.
Quanto a isso, não podemos esquecer que o culto a Deus deve ser à Sua maneira e não à nossa. Isto é, um culto que agrada a Deus deve ter os elementos que Ele quer, e não coisas que servem apenas para satisfazer os egos dos participantes.
No caso de Davi, a Arca era um elemento importantíssimo no culto ao Senhor. Mas, ao invés de fazer as coisas conforme Deus havia estipulado em Sua Palavra, com os sacerdotes transportando a Arca, ele preferiu fazer do seu jeito, pondo-a em um carro de Boi.
Cultuar a Deus conforme a vontade d’Ele, também envolve esforço e grande renúncia. Isso porque seremos tentados a seguir o fluxo dos demais e oferecer um culto antropocêntrico, em que o homem e seus problemas estão no centro.
Fazer as coisas à maneira de Deus é impopular e faz com que os nossos cultos sejam rotulados de retrógrados e inconsistentes com a nova geração. E é por isso que muitos pastores preferem seguir a manada, fazendo as coisas da maneira mais fácil e lucrativa.
Outra característica da religião verdadeira é que tudo tem seu tempo próprio. Quer dizer, na religião que agrada a Deus, não se pulam etapas. É tudo ao seu tempo. Já na religião fácil, as etapas mais importantes da vida cristã não são apenas evitadas, mas também desencorajadas, já que compreendem esforço e renúncia.
Hoje, para ser pastor não são necessárias mais a chamada, a confirmação da igreja e a preparação espiritual e teológica, como eram em tempos passados. Basta se ter a aparência certa e muita eloquência. É por esse motivo que dos púlpitos emanam todo tipo de heresias e falsos ensinos dos mais esdrúxulos e espúrios ao evangelho verdadeiro. Trato melhor desse assunto no meu livro “Pastores Forjados na Fornalha”, publicado pela editora AgBook e também disponível na Amazon.
De outra forma, para se ter proeminência no meio dessa geração de cristãos deformados, também não é necessário o título de pastor. Basta alguém ter a pirotecnia pentecostal certa que é reconhecido como um grande vulto. Não é nem preciso ser membro de uma igreja local, haja vista a quantidade de “profetas” independentes, que pulam de casa em casa, disseminando profecias que agradam os ouvidos incautos e enchem os bolsos dos pretensos profetas.
Em contraste com isso, Jesus conta uma parábola em Marcos 4.26-29 em que ele compara o Reino de Deus à plantação de cereais. Nesta parábola, Ele diz que primeiro é plantada a semente, depois ela germina e cresce, para só depois frutificar. E sua frutificação se dá primeiro na erva, depois na espiga, e só depois no grão na espiga. Em outras palavras, no Reino de Deus não se pulam etapas. É tudo ao seu tempo.
Algo que também é muito recorrente nesses dias é a citação de Mateus 7.7: “Não julgueis para que não sejam julgados”. Essas palavras tornaram-se uma expressão mágica que, segundo se pensa, afugenta os religiosos chatos, que enchem os saco dos descolados da nova geração.
Os que usam desse expediente se esquecem que o mesmo Jesus que disse “não julgueis” em Mateus 7, também disse: “Julgueis segundo a reta Justiça" em João 7.24.
As pessoas de hoje, em nome do politicamente correto, não tem mais senso crítico, engolindo de tudo o que se diz ter a chancela da Palavra de Deus. Mas, foi Jesus quem disse que devemos ficar de olho no fruto que as pessoas dão, pois quem é ruim não pode dar fruto bom (Mateus 7.20).
A religião fácil de Davi gerou a morte de Uzá. Mas quando ele reconheceu o seu erro, fazendo as coisas à moda de Deus, houve alegria plena, com o rei despojando-se de suas roupas pomposas e dançando diante da Presença do Senhor. Não que antes não houvesse tido certa alegria, pois quando o carro de bois começou a mover-se, todos cantaram e se alegraram. Porém, essa alegria foi pífia, diante da alegria que as coisas certas trouxeram.
Assim também acontece em nossos dias. A religião fácil tem certa alegria, certa empolgação devido às inovações dos engenheiros do entretenimento. Entretanto, é breve, sendo interrompida pela morte espiritual de seus participantes.
Para concluir devo dizer que hoje há duas portas abertas diante de nós. A primeira é muito larga e convidativa. É a religião de facilidades que está presente em muitas igrejas e é disseminada nas programações da TV. Por ser uma porta larga, até o indolente passa por ela. Pode-se passar sem nenhum cuidado e da forma que quiser, devido à sua grande dimensão. Todavia, a religião fácil gera a morte espiritual. E são tantos os que hoje se julgam vivos, mas estão mortos.
A segunda porta é bem estreita e sem atrativos humanos. É a religião verdadeira. É a religião da renúncia pessoal e que envolve o esforço, mas que agrada a Deus. Esta, diferente da outra, gera a alegria e nos conduz à vida eterna.
É interessante notar que, no caso de Davi, a morte de Uzá lhe deu uma lição dura, porém extremamente necessária. Depois daquela tragédia, Davi fez as coisas conforme Deus queria e assim, agradou ao Senhor, a si mesmo e ao povo que lhe elegeu seu rei.
Não obstante, quando estava fugindo de seu filho Absalão, por indicação do profeta Gade, Davi quis prestar um culto a Deus. Por isso dirigiu-se a um monte de propriedade de um homem chamado Araruna. Este, quando viu o experiente guerreiro em suas terras, lhe ofereceu gratuitamente tudo o que quisesse para realizar o seu culto a Deus. E as palavras de Davi nos ensinam muito: “Não oferecerei ao Senhor, meu Deus, holocaustos que não me custem nada” (2ª Samuel 24.24).
O rei Davi havia aprendido a lição. A religião verdadeira deve incluir algum esforço de nossa parte.
Reitero que, quando falo em esforço, não estou me referindo à Salvação, que é exclusivamente por meio da Obra de Cristo. Estou falando a respeito de agradar a Deus no nosso dia a dia, bem como em relação às bênçãos provenientes da Salvação.
A escolha da porta larga ou estreita não se fará no dia do Juízo, como muitos imaginam. Se faz no presente, enquanto estamos nos conduzindo nesta terra.
Diante do exposto, qual você escolhe: A religião fácil ou a religião verdadeira?
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