A IDOLATRIA GOSPEL E OS ALTARES DA CONVENIÊNCIA

 



 

Deitareis abaixo os seus altares, e despedaçareis as suas colunas, e os seus postes-ídolos queimareis, e despedaçareis as imagens esculpidas dos seus deuses, e apagareis o seu nome daquele lugar.

Deuteronômio 12:3

 

Na fronteira da terra prometida, um povo ansioso ouve seu líder falar pela última vez. O velho Moisés, de cajado na mão, fala à nova geração uma série de advertências que ficaram conhecidas como “lei estatutária”, que era a aplicação da Torá à nova realidade em que eles entrariam. 

A centralização do culto para evitar a adoração em lugares inapropriados, a separação entre o sagrado e o comum e a obediência como fonte de bênçãos são algumas das advertências dadas por Moisés. Mas a advertência que compõe Deuteronômio 12.3 é muito forte: o povo deveria eliminar todos os vestígios de cultos pagãos, incluindo altares e imagens.

Canaã, a terra prometida, então era habitada por povos pagãos com idolatrias profundamente enraizadas, com altares e imagens dedicados aos deuses. E o perigo de que o povo de Deus fosse influenciado por essa diversidade religiosa era grande.

A tentação de curvar-se às falsas divindades sempre assediou o povo de Deus, e esse é o motivo da ordem para destruir os altares e imagens. O Senhor é um Deus zeloso e exige exclusividade. A adoração a Jeová deve ser pura e sem influências externas.

E o que isso tem a ver conosco? A resposta é direta: tem tudo a ver! O povo de Deus hoje é profundamente ameaçado pelas “nações vizinhas”. E Deuteronômio 12.3 nos ensina que devemos manter a adoração pura e verdadeira. E para isso é necessário eliminar todas as práticas idolátricas e influências externas para que o nosso coração não se desvie.

E quais são os “altares estrangeiros” de nossos dias? Essa é outra resposta muito direta: o materialismo, o culto ao sucesso, a busca por prazer, a busca por reconhecimento, a busca por relevância e aprovação, dentre outras coisas. Dessa forma, nossos próprios desejos e ambições se tornam deuses em nossas vidas.

Os altares dessa idolatria são diferentes daqueles de Canaã: os altares agora estão no coração, local quase impossível de qualquer um acessar. Nesse contexto, o coração é como um templo, um espaço sagrado onde se deveriam cultivar os valores do Reino de Deus. Mas, ao invés disso, é entulhado com coisas falsas que supostamente trazem satisfação.

Mas há um tipo de idolatria ainda mais sutil e com maior probabilidade de dano: a idolatria gospel.

Em que ela consiste? É a idolatria a uma denominação, a um líder carismático, ou a um cantor que toca os corações com suas músicas. Esse tipo de idolatria passa despercebida porque vem disfarçada de piedade, de compromisso com a igreja, ou mesmo de obediência a Deus. Esse comportamento é chamado de idolatria porque vai além da mera admiração. Ele está ligado, antes de tudo, à necessidade de pertencimento e busca por empatia. Essa forma de idolatria molda a vida das pessoas em torno do objeto idolatrado, seja ela a uma organização ou a pessoas.

É interessante notar que quando há uma forte identificação com um grupo ou um indivíduo, há uma falsa sensação de valor pessoal e segurança. Essa idolatria leva as pessoas a fecharem os olhos para a queda daqueles que são idolatrados por eles. Muitos pastores caem em pecados hediondos e, mesmo assim, ainda são ovacionados pelos seus seguidores que, com argumento de que não se pode “tocar no vaso” se isentam de criticar suas práticas pecaminosas e abandonar seus ministérios. Da mesma forma, quando os cantores pecam, chamados atualmente de “levitas” mesmo não sendo da tribo de Levi, o que seus seguidores cegos alegam é que se interessam por suas músicas e não por suas vidas particulares. E quando as igrejas e denominações adotam práticas heterodoxas e/ou heresias, em nome da tradição, os seus adeptos arvoram bandeiras de guerra em sua defesa, com a alegação de que estão, na verdade, defendendo o evangelho.

Ao destruir esses altares, estamos nos libertando do coração entulhado e dando espaço para o Senhor transitar livremente. Isso me remete ao episódio quando, ao chegar no templo em Jerusalém, Jesus indignou-se face ao que haviam feito com a casa de Deus. Sua indignação foi tamanha que Ele toma uma atitude nunca vista no Mestre da paz: Ele faz um azorrague de cordéis, e mesmo que não tenha batido em ninguém, derrubou as mesas dos cambistas, espalhando no chão o dinheiro e expulsando os mercadores do templo. Isso porque, pela idolatria da ganância, aquelas pessoas transformaram a casa de Deus em casa de comércio (João 2.15,16).

Por causa daquelas bugigangas, Jesus, o dono do templo, não podia andar livremente na Sua Casa. E isso é uma parábola viva do que acontece com a idolatria que assola o coração dos crentes. São em tão grande número que impedem que o Senhor Deus transite por suas vidas.

Que aquilo que realmente tem valor possa ter lugar em nosso coração.

Entretanto, devo dizer que todo ser humano tem tendência a buscar  segurança em coisas materiais e passageiras, às vezes com tanta intensidade que se tornam como altares da conveniência que nos afastam do Senhor. Por isso, o primeiro passo da cura é reconhecer esses ídolos e assim dar início à libertação e à transformação espiritual. Mas é necessário que quebremos esses altares e que destruamos as imagens que povoam nossos corações.

Buscar por algo além de Deus não sacia – apenas anestesia. Não preenche – apenas distrai. Somente no Senhor, o único Deus, encontramos propósito para a nossa vida e saciedade para nossa alma.

Em Deuteronômio 12 encontramos uma sabedoria milenar que nos leva tanto a reavaliar nossas prioridades quanto a decidir rumo à plenitude de nossas almas e a uma vida abundante.

A cada altar destruído e a cada imagem quebrada, abrimos espaço para aquilo que é novo. Abrimos espaço para o Senhor escrever uma nova história em nossa vida. Uma história de triunfo em meio às grandes batalhas.

Mesmo que a idolatria venha disfarçada de cristianismo, ela continua sendo idolatria. E só quando nos desapegamos dela é que conseguimos adorar em espírito e em verdade.

Deuteronômio 12.3 é um chamado para reavaliarmos a nossa vida. Que possamos olhar para ela pelo prisma da sinceridade, confrontando os ídolos e altares que persistem em querer tomar o lugar do Senhor.

Que ídolos entulham o seu coração? Será que você está disposto a se desfazer dos ídolos para o Senhor fazer morada do seu coração? O retorno à realidade e a adoração pura é certamente uma experiência dolorosa, dada a intensidade com que as pessoas se entregam à idolatria. Deus ordena que você decida assertivamente desapegar dos ídolos e os quebrar, pois Ele não divide sua glória com ninguém (Isaías 42.8).

Encerro citando as palavras do apóstolo João que fazem eco com Deuteronômio 12.3: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos” (1ª João 5.21). Dessa forma, que possamos destruir todas as influências idólatras que possam corromper nossa adoração a Deus.

Nesta geração, cheia dos deuses das distrações, entretenimento e prazeres, o Senhor nos ordena a mantermos a nossa alma pura e uma devoção exclusiva a Ele.

Que quebremos os altares. Que joguemos fora os ídolos. E que o Senhor habite plenamente em nossos corações.

Ricardo Castro
Pastor, Doutor em teologia, Músico




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